Joesley Batista: as investidas do dono da JBS na diplomacia


Joesley Batista foi à Venezuela pedir a renúncia de Maduro, diz agência
O empresário Joesley Batista, um dos donos da JBS, maior produtora mundial de proteína animal, foi à Venezuela pedir para Nicolás Maduro deixar o governo, segundo a agência de notícias Bloomberg.
O empresário se encontrou com o presidente venezuelano em 23 de novembro, dias depois da conversa por telefone de Maduro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Na conversa, Batista teria apoiado uma transição pacífica de poder na Venezuela.
Ainda segundo a Bloomberg, o empresário visitou ao país vizinho por iniciativa própria e não foi convidado a ir em nome dos EUA, ainda que autoridades do governo Trump estivessem cientes da viagem.
O Palácio do Planalto não se posicionou sobre o tema e não confirmou à BBC News Brasil se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tinha conhecimento do encontro entre Batista e Maduro.
A JBS é controlada pela holding J&F, que também não comentou o teor das conversas. Em nota à agência, o grupo afirma apenas que Joesley Batista não representa nenhum governo.
A BBC Brasil também procurou Joesley Batista, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.
A ida do empresário brasileiro à Venezuela ocorreu em meio ao aumento das tensões entre Caracas e Washington. O governo dos EUA acusa Maduro de chefiar o “Cartel de los Soles”, classificado por Washington como organização terrorista.
No final de novembro, Trump chegou a anunciar que o espaço aéreo “sobre” e “nos arredores” da Venezuela seria fechado “por completo”.
Nos últimos meses, os EUA intensificaram a pressão sobre Maduro, considerando seu governo ilegítimo após a eleição de 2024, amplamente rejeitada por acusações de fraude.
O país realizou o maior destacamento militar em décadas no Mar do Caribe, executando uma série de ataques contra embarcações, principalmente venezuelanas, supostamente envolvidas com o narcotráfico no Caribe e no Pacífico Leste.
O país enviou o USS Gerald Ford, o maior porta-aviões do mundo, além de cerca de 15 mil militares — o maior deslocamento americano na região desde a invasão do Panamá, em 1989. Washington afirma que a operação pretende combater o tráfico de drogas.
Maduro nega as acusações e afirma que os EUA buscam derrubar seu governo para assumir o controle do petróleo venezuelano.
Segundo a Bloomberg, autoridades americanas tinham conhecimento dos planos de Batista de viajar a Caracas, mas não o enviaram em nome dos EUA.
A agência destacou o papel do empresário brasileiro como mediador na tentativa de amenizar as tensões políticas entre os países.
A JBS conseguiu recentemente a autorização para listar suas ações na Bolsa de Nova York
Michael Nagle/Bloomberg via Getty Images/BBC
Um ‘diplomata’ brasileiro
A presença do empresário Joesley Batista em Caracas expõe o papel que o sócio da J&F tem desempenhado nos bastidores da política internacional.
Em outubro, o empresário integrou a delegação empresarial que acompanhou Lula em sua viagem para o Sudeste Asiático, com passagem pela Indonésia e Malásia, em busca de caminhos alternativos diante de uma deterioração nas relações com Washington.
A viagem marcou o primeiro encontro entre Lula e Trump desde que os EUA impuseram tarifas de 50% sobre produtos brasileiros — medida que provocou a maior crise diplomática recente entre os países.
Apesar de não ocupar cargo público, Batista, que restabeleceu sua presença no comando da JBS após seu afastamento em 2017, manteve interlocução com figuras do governo Trump para reverter o tarifaço.
Ele ficou afastado da direção da JBS por cinco anos, até 2024, como parte do acordo de leniência assinado como o Ministério Público Federal relacionado à Operação Lava Jato.
Em setembro, o empresário esteve na Casa Branca para discutir o aumento de tarifas às exportações brasileiras, incluindo a carne bovina. As alíquotas adicionais para a proteína animal foram revistas em novembro.
A audiência ocorreu semanas antes do aceno do republicano a Lula na Assembleia-Geral da ONU, o primeiro sinal de afago na relação dos países.
A subsidiária da JBS nos EUA, a Pilgrim’s Pride, fez uma doação de US$ 5 milhões para a cerimônia de posse de Trump, de acordo com relatório apresentado à Comissão Federal Eleitoral (FEC, na sigla em inglês). Foi a maior quantia doada individualmente por uma empresa ao evento.
Em junho, a JBS conseguiu autorização para listar suas ações na Bolsa de Nova York, um processo que enfrentava impasses na Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) desde 2017.
Já em relação à Venezuela, as empresas do grupo J&F ampliaram interesses no setor energético.
A Âmbar Energia chegou a receber autorização do governo brasileiro para importar eletricidade da Venezuela para abastecer Roraima — operação que não avançou por questões técnicas, mas cuja habilitação preliminar continua válida.
A Fluxus, outra companhia do grupo, abriu escritório em Caracas e está prospectando reservas de petróleo há mais de um ano, diz a Bloomberg. A J&F negou à agência que haja negócios em curso no país.
A relação entre os países já vem de longa data. Em 2015, a JBS fechou com o governo venezuelano um acordo de US$ 2,1 bilhões para fornecer carne bovina e frango em um momento em que o país enfrentava grave escassez de alimentos.
A negociação envolveu autoridades venezuelanas de alto escalão, incluindo Diosdado Cabello, hoje ministro do Interior.
‘Joesley Day’
Em 2017, Joesley gravou uma reunião fora da agenda com o então presidente Michel Temer e provocou uma queda histórica na Bovespa
Andre Coelho/Bloomberg via Getty Images
Os irmãos Joesley e Wesley Batista viram o negócio familiar se transformar no maior produtor de carne do mundo, com auxílio do BNDES (banco nacional de fomento ao setor produtivo) durante os primeiros governos de Lula.
Os irmãos se envolveram profundamente no cenário político brasileiro: a JBS foi a maior doadora para a campanha eleitoral de 2014, gastando R$ 391 milhões, apoiando a vitória 164 deputados federais, seis governadores e da chapa formada pela ex-presidente Dilma Rousseff e por Temer.
Anos depois, Wesley e Joesley fecharam acordo de delação premiada após a realização de uma série de operações da Polícia Federal que tinham a J&F como um dos alvos – envolvendo, inclusive, denúncias de irregularidades na aprovação de empréstimos do BNDES.
Ele admitiu ter subornado centenas de políticos em troca de financiamento de bancos estatais e fundos de pensão.
Em 2017, Joesley gravou uma reunião fora da agenda com o então presidente Michel Temer como parte do acordo de delação.
O escândalo provocou uma das maiores quedas nas bolsas de valores da história moderna do Brasil, que foi apelidado de “Joesley Day”.
Na conversa gravada, Temer disse que “tem que manter isso aí” a Batista, ao falar sobre a boa relação de Joesley com o ex-deputado Eduardo Cunha.
Batista afirmou à época em sua delação premiada que Temer teria dado aval a uma operação para comprar o silêncio de Cunha sobre irregularidades envolvendo aliados.
Em entrevista à BBC News Brasil em 2019, Temer afirmou que a frase dizia respeito somente a manter a amizade com Cunha, não a qualquer irregularidade.
Temer continuou respondendo aos processos, mas nunca foi condenado e permanece livre. Muitos dos processos que envolvem o ex-presidente foram arquivados, inclusive o que levou à sua prisão.
O empresário Joesley Batista
Michael Nagle/Bloomberg via Getty Images/BBC

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