Estudo aponta indícios de reserva estratégica de minerais na Bacia do Parnaíba, no Piauí


Estudo indica reserva estratégica de minerais na Bacia do Parnaíba (PI)
O Serviço Geológico do Brasil (SGB) identificou 39 novas ocorrências de fosfato, elementos terras raras (ETR) e urânio na borda oriental da Bacia do Parnaíba, no estado do Piauí.
A descoberta consta em um estudo preliminar obtido com exclusividade pelo g1 e aponta que a região pode ter grande potencial para esses minerais estratégicos — insumos essenciais para a indústria tecnológica, energética e para a geopolítica global.
“Os resultados são preliminares, mas a tríade de minerais estratégicos no mesmo contexto é um bom indicativo”, afirma o diretor de Geologia e Recursos Minerais do SGB, Valdir Silveira.
A descoberta, se confirmada por estudos mais aprofundados, pode levar o Brasil a uma posição de maior destaque no cenário global de minerais estratégicos — especialmente no mercado de terras raras e urânio, dominado hoje por poucos países. Isso abriria caminho para o fortalecimento da cadeia produtiva nacional em setores como energia limpa, tecnologia de ponta e defesa, além de atrair investimentos e reduzir a dependência externa.
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➡️ O que são terras raras?
🔍Apesar do nome, as terras raras não são necessariamente escassas, mas são difíceis de separar e processar. Compõem um grupo de 17 elementos químicos usados em produtos como celulares, turbinas eólicas e veículos elétricos. São eles os 15 lantanídeos, além do escândio (Sc) e do ítrio (Y).
A utilidade de cada um deles varia e é crucial para a economia do futuro:
Fosfato: usado principalmente na produção de fertilizantes para a agricultura.
Urânio: empregado como combustível em usinas nucleares para geração de energia.
Terras raras: essenciais na fabricação de imãs, turbinas eólicas, celulares, carros elétricos e equipamentos militares.
Teores elevados e novo modelo de depósito
Segundo o levantamento, as concreções fosfáticas da região apresentaram teores de fósforo entre 16% e 27%, com média de 0,4% e valor máximo anômalo de 2,3% em uma das amostras.
Nos arenitos, os teores médios de terras raras chegaram a 0,2%, com picos de até 0,4%. Os dados indicam enriquecimento mineral mesmo em locais com baixo teor de fósforo, possivelmente devido à presença de minerais pesados de origem ígnea ou metamórfica e à ação de processos hidrotermais ou autigênicos.
Já o urânio foi detectado com teores que variam de 9 a 1.270 ppm — patamar considerado acima da média dos principais depósitos mundiais. “Esses teores tornam viável a recuperação do urânio mesmo em cenários econômicos desafiadores”, diz o relatório.
Segundo o SGB, as principais mineralizações de terras raras no Brasil atualmente estão ligadas a depósitos costeiros de areias monazíticas, complexos alcalinos e granitos. As ocorrências no Piauí, no entanto, configurariam um novo modelo de depósito no país.
“Esse tipo de concentração em rochas fosfáticas é raro e os valores encontrados, com até 2,3% [de um tipo de fosfato] posicionam a tipologia como uma das mais enriquecidas do mundo”, afirma Silveira.
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Urânio e a geopolítica da energia limpa
Silveira destaca ainda a importância da descoberta do urânio.
“Considerando a necessidade global de diversificação da matriz energética limpa, o mercado mundial de urânio ganha relevância e pode colocar o Brasil em posição de destaque em curto espaço de tempo”, avalia.
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Divulgação
Por que a Bacia do Parnaíba é importante?
A Bacia do Parnaíba abrange áreas dos estados do Maranhão, Piauí e Ceará. É a bacia sedimentar intracratônica mais estudada do país e cobre 282 municípios, em uma área de 331 mil km².
De acordo com o SGB, as formações onde as ocorrências foram detectadas se originaram em períodos de efeito estufa global, com amplas inundações marinhas. Essas condições favoreceram a deposição de materiais ricos em fósforo e a concentração de elementos estratégicos em ambiente com anoxia oceânica (falta de oxigênio).
Próximos passos
A pesquisa segue em andamento e deve passar por uma nova etapa de detalhamento. “Ainda não há estudos no Brasil para o aproveitamento deste tipo de minério, mas a extração em rochas fosfáticas não representa desafio tecnológico ou ambiental significativo”, afirma Silveira.
Segundo ele, os informes técnicos do SGB são uma forma de dar retorno rápido ao setor mineral. A ideia agora é aprofundar os dados com parcerias estratégicas. “Pretendemos avançar com instituições como o INCT e o CETEM para avaliar o aproveitamento dessas ocorrências”, diz.
O diretor também espera que a divulgação da descoberta atraia investimentos do setor privado. “E por que não dizer também na porção sul e ocidental da Bacia do Parnaíba, conhecida como Bacia do Maranhão?”, completa.
Potencial do Brasil nas terras raras
A descoberta anunciada no Piauí reforça o potencial do Brasil para se tornar um dos principais players globais na produção de terras raras. Embora o país ainda enfrente gargalos no beneficiamento e refino desses minerais, estudos recentes mostram que há um caminho promissor para desenvolver uma cadeia produtiva nacional.
Segundo o Serviço Geológico dos Estados Unidos, o Brasil possui a segunda maior reserva de terras raras do mundo, atrás apenas da China.
No entanto, diferentemente dos chineses, que avançaram ao longo das últimas décadas na verticalização da cadeia, o Brasil ainda exporta boa parte de seus minérios em estado bruto, sem agregar valor.
O governo federal reconhece o desafio e trabalha em projetos para incentivar a industrialização do setor.

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