Adeus, B3: por que empresas estão deixando a bolsa mesmo com o Ibovespa em recorde?


A espanhola Iberdrola anunciou uma Oferta Pública de Aquisição (OPA) para comprar todas as ações da Neoenergia e retirar a empresa da B3. Se a operação for adiante, a elétrica se junta ao grupo de empresas que fecharam capital em 2025.
Desde 2023, 32 companhias saíram da bolsa brasileira, segundo dados compilados por Einar Rivero, da Elos Ayta. Entre janeiro e outubro deste ano, além da Neoenergia, outras nove deixaram o mercado, como Santos Brasil (STBP3), Carrefour Brasil (CRFB3) e JBS (JBSS3), após a fusão com a BRF (BRFS3).
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Enquanto isso, o Ibovespa acumula recordes em 2025. De cerca de 120 mil pontos no início do ano, atingiu 158.555 pontos no fechamento de quarta-feira (26). Nesta sexta (28), também renovou a máxima intradiária, superando os 159 mil pontos durante o pregão.
A valorização acumulada no ano já supera os 31%, reflexo da combinação entre juros atrativos no Brasil e o fluxo de capital estrangeiro em busca de ativos mais rentáveis.
Mas, se o Ibovespa está em alta, por que tantas empresas estão deixando a bolsa? A seguir, os motivos por trás da onda de OPAs e o que ela revela sobre o momento do mercado e da economia.
O que é uma OPA e por que empresas estão saindo da B3
💰 A Oferta Pública de Aquisição (OPA) funciona como o oposto da Oferta Pública Inicial (IPO). Enquanto o IPO marca a entrada da empresa na bolsa para captar recursos, a OPA é usada para fechar o capital por meio da recompra das ações dos demais acionistas.

Os motivos para promover uma OPA variam. No caso da Santos Brasil, o grupo francês CMA CGM comprou cerca de 48% da empresa por R$ 6,3 bilhões. Fusões e decisões estratégicas também explicam parte das saídas.
Já a Iberdrola afirmou que a OPA da Neonergia tem o objetivo de “simplificar a estrutura corporativa e organizacional da Neoenergia, fornecendo, portanto, maior flexibilidade na gestão financeira e operacional de suas atividades.”
Segundo Marcos Praça, diretor de análise da Zero Markets Brasil, muitas empresas deixam a bolsa porque o custo de permanecer listada é alto e a pressão por resultados trimestrais é intensa.
“O Donald Trump chegou a dizer que gostaria de acabar com o reporte trimestral nos EUA, porque coloca as empresas numa ‘maratona’ contínua”, afirma. “Isso atrapalha estratégias de médio e longo prazo. Qualquer recuo, investimento maior, contratação ou corte vira motivo para o investidor reclamar e vender a ação, derrubando o preço no curto prazo.”
Ele acrescenta que, com juros altos no Brasil (a Selic está em 15% ao ano desde junho), os investidores exigem retornos maiores, algo que muitas companhias não conseguem entregar.
🔎 Quando a Selic está muito alta, os investimentos seguros, como títulos públicos e renda fixa, já rendem bastante sem risco. Com isso, os investidores só topam colocar dinheiro em ações se elas puderem render mais do que esses 15% ao ano. Como muitas empresas não conseguem oferecer um retorno tão alto, a ação perde atratividade.
As exigências de governança, transparência e manutenção de uma estrutura de Relações com Investidores também encarecem a operação.
Nesse contexto, as empresas listadas na bolsa passam a ver mais vantagens em fechar capital para reduzir custos e executar projetos sem pressão constante por investidores. O movimento ocorre mesmo com o Ibovespa em alta.
Para Frederico Nobre, gestor de investimentos da Warren, outro fator é a percepção de que muitas ações estão baratas demais.
“O controlador pode considerar que sua empresa está sendo negociada por valores muito baixos. Nos últimos anos, inclusive, houve casos de IPOs reversos, quando companhias abertas são compradas por outras empresas para serem listadas de forma mais rápida e com menos burocracia.”
Ele lembra que os IPOs praticamente desapareceram e que investidores institucionais têm priorizado renda fixa e crédito. O último IPO da B3 foi o da Vittia (VITT3), em setembro de 2021. Desde então, o interesse no capital aberto e a disponibilidade de financiamento via mercado caíram, segundo ele.
Se o Ibovespa está batendo recordes, por que empresas saem da bolsa?
Segundo os analistas, os recordes do Ibovespa não refletem o desempenho de todas as empresas. O índice mede a média das ações mais negociadas — e é altamente concentrado.
📈 Os pontos do Ibovespa são apenas um número usado para mostrar se as ações mais negociadas da bolsa subiram ou caíram. Não representam dinheiro, mas sim a variação média do mercado: quando o índice sobe em pontos, significa que essas ações se valorizaram; quando cai, que se desvalorizaram.
Os especialistas afirmam que superar uma determinada marca de pontos não tem um significado técnico, mas forma um marco psicológico importante que atrai atenção para a bolsa.
“Usamos o Ibovespa como termômetro, mas com cautela”, afirma Marcos Praça, comparando o índice ao S&P 500, nos EUA, também concentrado em poucas empresas.
“Na B3 acontece algo parecido. Vale e Petrobras representam juntas mais de 15% do peso do Ibovespa. Se elas sobem, puxam o Ibovespa, mesmo que várias empresas estejam estagnadas ou caindo. Itaú e outros grandes bancos também têm peso enorme.”
Felipe Tavares, economista-chefe da BGC Liquidez, afirma que a alta do Ibovespa não significa que o mercado brasileiro esteja excepcionalmente forte. “A bolsa sobe porque temos poucas opções de empresas e, com o cenário de juros altos, muitas companhias foram incentivadas a recomprar ações.”
Além disso, a volatilidade na bolsa americana e nas big techs também leva investidores estrangeiros a buscarem alternativas em mercados emergentes, como o Brasil. (entenda abaixo)
O que explica os recordes do Ibovespa?
De acordo com os analistas, a alta recente é impulsionada sobretudo pela entrada de capital estrangeiro. Segundo a B3, 58,30% dos recursos investidos na bolsa neste ano vieram do exterior.

Outro fator foi a mudança de direção do Federal Reserve. O banco central americano cortou os juros duas vezes em 2025, reduzindo o rendimento das Treasuries (o “Tesouro Direto” dos EUA) e incentivando investimentos em mercados emergentes, onde o Brasil se destaca pelos juros elevados.
Com isso, cresce a entrada de capital na bolsa e a valorização do real. Marcos Praça lembra que a B3 ficou “parada” por anos após a pandemia, enquanto outras bolsas se recuperaram mais cedo. “O avanço recente é mais uma correção do atraso do que um verdadeiro boom.”
Sede da B3, a bolsa brasileira, no Centro de São Paulo
Divulgação/B3

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