Ford Maverick Tremor fica mais afiada para incomodar a RAM e reconquistar clientes
A Ford tem a inglória missão de reconquistar a confiança dos brasileiros e preservar a presença da marca após o fechamento das fábricas e da maior parte das concessionárias no país. Assim, quando se trata de lançamentos, não há espaço para erros.
A picape Maverick chegou ao Brasil em 2022, um ano após os acontecimentos, oferecendo menos equipamentos do que o esperado para sua faixa de preço e competindo em um nível inferior ao da principal rival, a RAM Rampage.
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Pois a nova Maverick Tremor, versão off-road lançada por R$ 239,9 mil, veio para corrigir essas falhas: recebeu melhorias significativas, incluindo acessórios e equipamentos voltados para o uso fora de estrada — como pneus de maior aderência, ganchos de reboque, caçamba preparada para lama e piloto automático para enfrentar atoleiros.
O g1 testou a nova Maverick Tremor por uma semana para avaliar se as mudanças realmente funcionam e, acima de tudo, se a Ford conseguiu aprimorar sua picape de entrada para competir com as rivais e devolver brilho à marca no mercado brasileiro.
Ford Maverick Tremor 2026
Fabio Tito/g1
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No visual, a Ford Maverick Tremor se distingue da versão tradicional. As diferenças mais marcantes aparecem nas cores chamativas, como o laranja aplicado no centro da grade dianteira, além de um item exclusivo desta configuração: dois ganchos frontais, úteis para rebocar veículos presos em atoleiros ou obstáculos.
Os pneus também se destacam entre as mudanças e foram projetados para equilibrar desempenho no asfalto e em estradas de terra. Nos testes, garantiram tração firme mesmo em trechos com pedras soltas, sem causar aumento significativo no consumo de combustível.
Um ligeiro aumento no consumo em asfalto liso é esperado, já que esse tipo de pneu prioriza a aderência em trilhas e aumenta a capacidade de tração em diferentes superfícies. Junte com a possibilidade de tracionar as quatro rodas e o consumo pode aumentar ainda mais.
Outro ponto curioso é que o desenho dos pneus gerou um ruído grave dentro da cabine em baixas velocidades, o que foi considerado positivo, por transmitir a impressão de um motor mais robusto e potente. Embora seja um detalhe, agradou a todos que estiveram dentro da picape.
Ford Maverick Tremor por fora
Esta versão traz ainda uma capota marítima com barras rígidas que se movimentam junto à lona ao ser recolhida, além de revestimento áspero no piso da caçamba. Embora não tenha sido testada em dias chuvosos, ao lavar a picape foi possível caminhar pela parte traseira sem qualquer risco de escorregar.
Na caçamba, a Maverick Tremor já oferece vários pontos positivos. Há duas saídas de 12 volts, que podem ser adaptadas conforme a necessidade do usuário, além de uma tomada do padrão americano, de 110 volts e potência de até 400 watts.
Com ela, é possível ligar diferentes equipamentos. É possível, por exemplo, conectar um PlayStation 5, que consome cerca de 200 watts, e até uma TV de 65 polegadas, que chega a 170 watts em modelos LED da Samsung, usando apenas essa tomada.
Tomada na caçamba da Ford Maverick Tremor
Fabio Tito/g1
Picape é confortável e simples, ao mesmo tempo
No interior, as mudanças são pontuais e bem aplicadas. A central multimídia ganhou tela maior, com 13,2 polegadas e o crescimento removeu um nicho lateral de pouca utilidade. Nele cabiam apenas um punhado de moedas, já que até mesmo um ticket de estacionamento poderia cair ao menor movimento do carro.
A nova central também exibe imagens da câmera em 360 graus, ausente na versão anterior. O recurso facilita o uso urbano e ajuda até mesmo em trilhas: a câmera frontal pode ser acionada para compensar o capô elevado e oferecer visão clara do que está à frente.
Além disso, há outra tomada idêntica à da caçamba na parte traseira do apoio de braço dianteiro, voltada para os passageiros. Não é exatamente para ligar outro videogame ou uma TV, mas torna possível usar um notebook ou mesmo uma geladeira portátil durante a viagem.
Porta da Ford Maverick Tremor é totalmente feita em plástico
Fabio Tito/g1
Outro aspecto relevante foi o conforto, apesar do acabamento totalmente em plástico rígido nas portas. Nesse caso, o próprio veículo transmite uma sensação de robustez, o que combina com esse tipo de material.
Ao contrário de concorrentes, como alguns modelos da Volkswagen que utilizam plástico de sensação pouco agradável, a Ford Maverick aposta em diferentes texturas, variação de cores e até parafusos aparentes, reforçando a ideia de robustez — mesmo utilizando plástico, algo incomum em veículos desse perfil mais bruto.
Outro ponto positivo é a praticidade: o plástico utilizado na Maverick facilita a limpeza depois de uma trilha com barro, já que a lama inevitavelmente suja o interior. O tapete de borracha rígida, por exemplo, pode ser removido e lavado facilmente com uma mangueira.
Ford Maverick Tremor por dentro
Motor anda e bebe bem
Se em conforto e tecnologia a Maverick se destaca, é na dirigibilidade que ela realmente impressiona. O motor 2.0 turbo a gasolina, com 253 cv de potência, demonstrou versatilidade para lidar bem com qualquer situação.
Ele não é dos mais econômicos, mas ninguém compra um carro com esse motor esperando economizar combustível. Durante os testes, o melhor número que foi alcançado foi de 10,5 km/l na estrada e 7,5 km/l na cidade.
Em nenhum momento houve ultrapassagens inseguras por falta de potência ou retomadas lentas. A picape manteve o bom desempenho mesmo com quatro adultos a bordo. O mérito também vai para os 38,7 kgfm de torque, em conjunto com o câmbio automático de oito marchas.
Na trilha, o torque se destacou ainda mais. Subidas íngremes foram vencidas sem barulho exagerado do motor, mesmo com o câmbio configurado para manter marchas baixas — algo que normalmente intensifica o ronco do motor.
Tanto na trilha quanto na cidade, dois pontos chamaram a atenção:
As rodas agora possuem maior ângulo de esterço em relação à versão anterior. Isso resultou em melhor manobrabilidade em estacionamentos apertados e também permitiu girar a picape com facilidade em uma estrada de terra.
O sistema de câmeras em 360 graus também fez diferença na trilha. Não foi necessário pedir ao passageiro que descesse para orientar a manobra, já que a visão externa estava toda disponível na tela.
Na trilha, um dos passageiros — sem grande interesse por carros — ficou surpreso com a facilidade com que uma picape de dimensões maiores que as de um carro comum conseguiu girar e retornar ao trajeto.
Em outro momento, um convidado com longa experiência em picapes reforçou a percepção positiva sobre o conjunto da Maverick. Já cogitou, inclusive, como lidaria com as acelerações mais vigorosas e a caçamba espaçosa para transportar compras da lanchonete que administra.
De fato, a Ford Maverick Tremor acerta em diversos aspectos, sobretudo ao corrigir falhas das versões anteriores. Hoje, se mostra um carro versátil para múltiplos usos, até mesmo para quem não necessita de uma picape no dia a dia, mas valoriza a possibilidade de transportar algo grande, como uma geladeira, quando necessário.
Com isso, a picape transmite a mensagem de ser confortável para todos os ocupantes, oferece recursos tecnológicos relevantes em qualquer veículo moderno e, ao mesmo tempo, cumpre bem o papel de robustez esperado em uma picape.
Ford Maverick Tremor: vale a pena?
Na comparação direta, a principal rival é a RAM Rampage com motor a gasolina. Embora ofereça parte do conforto e da tecnologia, a concorrente custa cerca de R$ 30 mil a mais que a Maverick Tremor — mesmo sem os aprimoramentos off-road presentes na versão avaliada.
Com uma diferença de preço equivalente a um terço de Renault Kwid, é difícil não considerar a Maverick Tremor. Mesmo que a Rampage se aproxime do valor ou fique mais barata, o modelo da Ford ainda entrega mais e continua sendo a opção mais vantajosa.
Resta saber se o consumidor terá a mesma percepção. A Ford fez a lição de casa: corrigiu várias falhas da versão anterior e entregou um produto mais completo que a principal concorrente. Acontece que o prestígio das picapes RAM ainda pode ser um grande empecilho.
Por que a Ford não vende como antes?
Mesmo com o nome do cupê produzido no Brasil com motores de 4, 6 e 8 canecos, durante os anos de 1970, a picape não demonstrou a mesma força e as vendas são baixas desde que chegou ao país, em 2021.
A principal rival, a RAM Rampage a gasolina, vendeu 7,4 vezes mais entre janeiro e agosto de 2025, de acordo com a Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave):
RAM Rampage: 15.569 unidades emplacadas;
Ford Maverick: 2.066 unidades emplacadas.
Como a nova Ford Maverick começou a ser vendida apenas em 28 de agosto, ainda é cedo para medir o impacto da atualização nas vendas. No entanto, em comparação aos oito primeiros meses de 2024, a picape (antes da reestilização) emplacou 181 unidades a menos em 2025.
De acordo com especialistas ouvidos pelo g1, a retração da Ford no Brasil decorre de vários fatores. O fechamento das fábricas no país e a redução no número de concessionárias contribuíram diretamente para que a marca perdesse espaço no imaginário dos consumidores.
“A Ford ter saído do país é apenas um dos motivos, se bem que é bom lembrar que ainda existe como importador, trazendo, inclusive o Territory. Uma movimentação desta assusta o consumidor e leva ao medo. A Ford paga o preço pelas decisões e não falo que foram erradas”, revela Milad Kalume Neto, consultor independente do setor automotivo.
“Não se pode desconsiderar o markefing forte da Stellantis. A Ford vem recuperando espaço e, diferente de antes, agora é rentável. A Maverick é um belo produto, ótima qualidade, mas não vende como RAM”, conclui.
A redução no número de concessionárias também é um ponto destacado pelo consultor. Atualmente, segundo a Associação Brasileira dos Distribuidores Ford (ABRADIF), restam 79 lojas — uma queda de 72% em relação às 283 que existiam antes do fechamento das fábricas da Ford no Brasil.
Já a RAM conta com 149 concessionárias no Brasil, número 88,6% superior à quantidade de pontos onde o consumidor pode comprar veículos Ford.
Outro aspecto relevante é que a RAM atua exclusivamente com picapes, enquanto a Ford mantém uma linha mais variada, que inclui SUVs e modelos esportivos, como o Bronco e o Mustang. Assim, em toda concessionária da RAM o cliente encontra apenas picapes, consolidando uma marca forte.
Já para Paulo Garbossa, especialista em mercado automotivo e diretor da ADK Automotive, a Ford perdeu competitividade no Brasil por preço.
“O brasileiro, hoje em dia, deixou de ser fiel à marca e é fiel ao bolso. Então aquilo que entregar custo benefício pelo menor preço, acaba levando. Não chega a ser um desencanto com a Ford. Ela tem bons produtos, mas o mercado é competitivo. Tem um preço melhor? Então o pessoal leva”, aponta.